sexta-feira, 24 de março de 2017

Erros aleatórios explicam maioria das mutações que causam câncer

Um estudo divulgado essa semana pelo Science causou polêmica ao apontar que dois terços dos cânceres decorrem de puro azar mesmo, ou seja, surgem devido a uma falha aleatória no processo de duplicação do DNA!
Talvez esteja aí a resposta para aqueles que, mesmo levando uma vida saudável, não tendo predisposição genética ou estando muito longe de outros fatores de riscos tiveram câncer e ainda se perguntam: O que fiz de errado, o que comi de errado, o que somatizei????
Segue matéria publicada hoje no jornal O Estado de São Paulo.


Fábio de Castro e Giovana Girardi

24 Março 2017 | 03h0


Erros aleatórios explicam maioria das mutações que causam câncer, diz estudo
Cientistas atribuem 29% dessas mutações a fatores ambientais e apenas 5% a fatores hereditários
Erros imprevisíveis e aleatórios que acontecem naturalmente no processo de duplicação do DNA são responsáveis por cerca de 66% (2/3) das mutações celulares que causam câncer, de acordo com novo estudo realizado por cientistas americanos e publicado nesta quinta-feira, 23, na revista Science. Os autores atribuem 29% dessas mutações a fatores ambientais e apenas 5% a fatores hereditários.
No estudo, os cientistas da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, utilizaram um modelo matemático para analisar sequências de DNA de 32 tipos de tumores e associaram esses resultados a dados epidemiológicos obtidos em 423 bases de dados de 69 países. Eles concluíram que, na média para todos os tipos de câncer, dois terços das mutações são atribuídas a erros aleatórios no processo de cópia do DNA, durante a divisão natural das células. “Já é bem conhecido que devemos evitar fatores ambientais como o tabagismo para reduzir nosso risco de ter câncer. Mas é preciso lembrar que cada vez que uma célula normal se divide e faz uma cópia de seu DNA, para produzir duas novas células, ela comete múltiplos erros”, disse um dos autores do estudo, Cristian Tomasetti.
“Esses erros de duplicação são uma potente fonte de mutações tumorais que historicamente têm sido cientificamente subestimados. Esse novo estudo fornece pela primeira vez a estimativa da quantidade de mutações que é causada por esses erros”, explicou.
Segundo outro dos líderes do estudo, Bert Vogelstein, também da Johns Hopkins, apesar das conclusões do estudo, é preciso continuar a estimular as pessoas a evitarem agentes ambientais e estilos de vida que aumentem o risco de desenvolver mutações que levam ao câncer.
“No entanto, muita gente ainda desenvolverá tumores por causa desses erros aleatórios na duplicação do DNA. Por isso, precisamos com urgência de métodos melhores para detectar todos os tipos de câncer mais precocemente, enquanto eles ainda são curáveis”, afirmou Vogelstein.
De acordo com o cientista, na maior parte das vezes os erros de duplicação não causam dano algum. Mas ocasionalmente aparecem em um gene que regula a proliferação celular, levando ao câncer. “Nosso objetivo era tentar pela primeira vez calcular quantas dessas mutações encontradas no câncer são causadas pelo ambiente, hereditariedade, ou um fator aleatório.”
Os cientistas estimam, por exemplo, que as mutações cruciais para os tumores do pâncreas são provocadas por erros aleatórios em 77% dos casos, por fatores ambientais em 18% e por fatores hereditários em 5%. Nos tumores da próstata, do cérebro ou dos ossos, mais de 95% das mutações são atribuídas a erros aleatórios de duplicação, segundo o estudo. Já no câncer de pulmão, 65% das mutações são decorrentes de fatores ambientais – em especial o cigarro – e 35% aos erros de cópia do DNA. Não há registro de fatores hereditários relacionados a câncer de pulmão.
Acaso e prevenção. De acordo com Vilma Regina Martins, superintendente de pesquisa do A.C. Camargo, o estudo ajuda a explicar casos de pessoas que nunca fumaram e tiveram um câncer de pulmão, por exemplo. “Os pesquisadores explicam que, de fato, existe uma fração de casos que não está ligada ao fumo e pode ser causada por mutações aleatórias. Mas isso em nenhuma hipótese elimina a busca pela prevenção dos fatores de risco. Só mostra que existem tumores que não estão ligados ao ambiente e, nesses casos, a detecção e o tratamento precoce são importantes.”
Roger Chammas, coordenador do Centro de Investigação Translacional em Oncologia do Instituto do Câncer de São Paulo (Icesp), faz uma ressalva: as alterações ambientais talvez não sejam indutoras diretas das mutações, mas seu papel indireto não pode ser descartado. “O que esse estudo mostra é que é muito difícil predizer quando vai acontecer uma mutação. Por causa disso, talvez ele não seja tão evitável quanto a gente gostaria. Mas os fatores ambientais, assim como os hereditários, interferem na chance de termos alterações replicativas. E talvez a gente ainda não conheça todos os detalhes sobre fatores ambientais que provoquem isso”, explicou.
Análise: Ainda que seja isso, é possível prevenir 30% dos casos de câncer
Fatores ambientais como fumo, obesidade e alimentação devem ser considerados.
Deve-se deixar claro que esses dados (de que erros imprevisíveis e aleatórios que acontecem naturalmente no processo de duplicação do DNA são responsáveis por cerca de 66% das mutações celulares que causam câncer) ainda devem ser corroborados por outros cientistas. Existem outros trabalhos que precedem este publicado agora, que levantam a suspeita de que 90% dos tumores tenham causas ambientais e, ainda, que boa parte tenha erros genéticos natos ou durante a replicação de células, mudando totalmente o conceito difundido até pouco tempo.
Sabe-se hoje, também, que se deve atribuir à genética somente 10% de todos os cânceres.
Este trabalho questiona conceitos com análises preliminares e importantes, mas não consegue, de forma definitiva, provar que as causas ambientais não representam o maior fator de risco para câncer. Essa associação de fator ambiental com uma potencial predisposição para a doença ainda parece ter mais força, acima de um erro aleatório de replicação, que talvez não tenha impacto suficiente para ser fator decisivo de risco.
De qualquer forma, assumindo que os pesquisadores estejam corretos, temos uma oportunidade de reduzir o câncer em aproximadamente 30% dos casos, também atuando de modo mais assertivo em fatores ambientais como fumo, obesidade, e alimentação.

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